As Flechas
- Alessandra Medeiros

- 15 de nov. de 2024
- 3 min de leitura
Atualizado: 27 de nov. de 2024
No começo do ano, fui atingida por uma flecha lançada pelo “Selvagem – Ciclos de Estudos”. Uma flecha feita de narrativas, imagens compostadas, sonhos e perguntas que abrem caminhos.
“As flechas” fazem parte de uma série audiovisual disponível no YouTube, concebida como um gesto para "adiar o fim do mundo", nas palavras de Ailton Krenak.
ASSISTA AQUI:
A primeira vez que assisti às flechas foi numa casinha onde morava, lá em Capim Macio. Essa casa não tinha janelas, apenas um comungol na cozinha, que deixava o sol entrar enquanto o muro do vizinho não o escondia. Além dessa, a única luz externa vinha da porta, que dava para uma pequena área antes do portão.
Embora fosse noite quando assisti ao vídeo, o sol invadiu a minha casa.
É um trabalho muito rico, sensível e ativador, assistam.
Depois que eu assisti, quis conhecer o trabalho de Ailton Krenak.
Fui então ler as "Ideias para adiar o fim do mundo" e ao falar sobre "adiar o fim do mundo", Krenak não apenas denuncia a cisão entre os humanos e a natureza, mas também aponta para uma ferida mais profunda: a desconexão com nós mesmos.
Ao enxergarmos a terra apenas como um recurso a ser explorado, deixamos de enxergar a sua vitalidade e, por extensão, a nossa. De certa forma, aceitando a exploração da terra, aceitamos a nossa também.
Afim de libertação, continuei lendo, estudando e conhecendo o pensamento decolonial.
Nesse percurso, encontrei Boaventura de Sousa Santos e seus estudos sobre a "epistemologia da separação", uma lógica que divide e hierarquiza, silenciando tudo o que não cabe nos moldes da racionalidade ocidental.
Essa separação, que não está presente apenas em livros ou teorias, mas em nossos corpos e em nossas relações, se apresenta como um recurso fundamental para a manutenção da lógica capitalista, sustentando os interesses de quem a propõe.
Dividimos a razão da emoção, o humano da natureza, o individuo da sociedade, a saúde mental da saúde física, e até o conhecimento de sua prática cotidiana.
Por sorte, em nosso mundo existem pessoas com interesses coletivos, dispostas a unir o que fragmentam, por meio de perspectivas integradoras, que até partem de pontos diferentes, mas se entrelaçam como rios que convergem, cada um trazendo algo diferente, mas fluindo em direção a um mesmo mar.
O meu objetivo ao te apresentar a série "Flechas", compartilhando um pouco do meu percurso de estudos, é movimentar perguntas como: De onde surgiu a nossa concepção de vida? Porque vivemos assim? Há outras formas de viver? Por que insistimos em homogeneizar o mundo? Que forças nos levam a negar a pluralidade? Quem realmente se beneficia de um mundo tão fragmentado e padronizado?
Talvez, adiar o fim do mundo seja sobre emancipar sujeitos, reaprendendo a conviver: com a terra, uns com os outros e conosco mesmos. A vida floresce justamente nos encontros, nas diferenças e nos contrastes. Que chegue o dia em que a diversidade seja mais do que um ideal. Que ela seja vivida plenamente. Nesse momento, talvez, a humanidade finalmente avance.
Referências:
ALBERTO, Bruce. A invenção de um outro: etnologia, educação e saúde no Brasil contemporâneo. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2013.
KRENAK, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2019.
SANTOS, Boaventura de Sousa. A sociologia num mundo em crise: reflexões sobre a crise do conhecimento e da sociedade. São Paulo: Editora Boitempo, 2002.
VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. A inconstância da alma selvagem: e outros ensaios de antropologia. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2002.



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